No Dia da Indústria Gráfica, que se celebrou a 24 de junho, as associações setoriais portuguesa e brasileira – APIGRAF e ABIGRAF – juntaram cerca de 360 profissionais online, para falar sobre o presente e o futuro nos dois lados do Atlântico. O encontro revelou que ambos os países partilham mais do que a língua com diferentes sotaques, mostrando que há muitas vantagens na partilha da informação e experiência.
Lopes de Castro, presidente da APIGRAF, e Levi Ceregato, presidente da ABIGRAF, abriram a sessão. Levi Ceregato citou Camões: “Jamais haverá ano novo se continuar a copiar os erros dos anos velhos”, lembrando a importância da inovação para ultrapassar a atual crise decorrente da pandemia da COVID-19.
Lopes de Castro relembrou que, enquanto indústria que serve todas as outras, inevitavelmente haverá o reflexo do impacto dessas mesmas indústrias clientes na atividade das empresas gráficas. “Passámos pelas crises de 1992 e 2009, mas conseguimos estudá-las e percebê-las. Esta é completamente diferente”, comentou. “Todos sabemos que a indústria está sobredimensionada, com excesso de oferta”, refere o líder da associação nacional, que sublinha que é necessário ganhar escala para poder olhar para o mercado europeu e mostrar que as empresas nacionais são capazes de dar resposta às solicitações. O empresário alerta também que, sendo uma indústria de comunicação gráfica, é imperativo aprender a comunicar melhor para mostrar que sempre foi pioneira na absorção e integração das novas tecnologias.
Setor a setor
Nas várias intervenções foi possível verificar que, apesar das dimensões díspares entre países, os segmentos da indústria são afetados da mesma forma em Portugal e no Brasil. A rotulagem e a embalagem prosperam nos dois países – embora não com a glória de outros tempos – enquanto os mercados editoriais e promocionais recebem os impactos mais negativos.
Embalagem
Sidney Aniversa Victor, da brasileira Congraf, falou acerca da dificuldade de implementar planos de contingência em pouco tempo e da necessidade de continuar a laborar para dar resposta às solicitações do mercado, quando iniciou a pandemia. Uma dificuldade também partilhada por Cristina Baeta, da portuguesa Olegário Fernandes, que referiu que após os picos iniciais na produção, agora notam algum abrandamento. Ainda assim, refere “o trabalho de prospeção com uma presença mais próxima do cliente parou, e isso faz diferença”, sublinhando que as reuniões por via digital continuam, mas não são o contacto ideal.
Editorial
Carlos Jacomine, da Plural, a maior gráfica com rotativas na América do Sul, revela que já notava sinais de abrandamento do segmento editorial antes da pandemia, na casa dos 20 a 25%. Esse número agravou-se para os 70%, também devido ao impacto na atividade da distribuição do produto editorial durante a pandemia. Jacomine espera que esse segmento sobreviva, porém que não retorne a níveis muito melhores. A estabilidade pode ser encontrada nos materiais de apoio para o ensino à distância e nos catálogos promocionais das grandes marcas.
Lopes de Castro, a intervir em nome da gráfica Norprint, revela que, em Portugal, a redução na atividade rondou os 80%. “Temos que recomeçar e dinamizar a economia, e ver se é possível recuperar algo no segundo semestre”, conclui.
Promocional
Josair Santos Bastos, diretor da Gráfica Trio, falou sobre as dificuldades do mercado Promocional, e do efeito cascata que acontece com a falta de pagamentos. Houve o cancelamento de muitas ordens de serviço, na zona da Bahia, sendo que os clientes também não pagam os serviços já efetuados, com a justificação de que os seus próprios clientes também não cumprem com os deveres. “A minha experiência diz que a retoma será gradual”, diz, e que é necessária, pois “se não morrermos da COVID poderemos morrer de fome”.
Bruno Moluras, da Onda Grafe, falou sobre a grande queda na faturação nos meses de março e abril, em cerca de 70%. Em junho, diz que já nota alguma retoma, porém é cauteloso. O facto de se enfrentar o mesmo problema a nível mundial vai acelerar a recuperação, acredita, referindo que “há que resistir à crise, modernizar, continuar a investir e reestruturar o que é necessário”. Depois de tudo, espera, teremos uma economia mais forte. Por agora, a Onda Grafe prepara uma loja online, projeto que estava adormecido e que recebe um novo impulso com a atual onde de adoção da digitalização.
Rótulos
Cristhine Samorini, da Grafitusa, apelou a que se olhem para novas tecnologias para modernizar as aplicações gráficas, perspetivando um aumento da impressão em autoadesivos, paralelamente ao crescimento do e-commerce. Tita Fernandes, da Mofitex, reportou um aumento de 30% na produção no mês de março, altura em que foi necessário redimensionar a capacidade e criar planos de contingência para a pandemia. Contudo, “isso chegou com os custos atípicos de ter que fazer muito stock de matérias-primas, por exemplo”, explica a empresária. Alerta ainda que “a oferta é maior que a procura”, por isso não haverá o “boom” que todos esperam e que, numa altura em que se utiliza a sustentabilidade como bandeira, o mercado está a consumir mais filme em detrimento do papel. Urge, por isso, apostar em soluções mais amigas do ambiente e continuar a mostrar o que a pandemia revelou: que esta é uma indústria essencial à vida em sociedade.
Comunicação Visual
André Linares, da brasileira Corgraf, relata que o segmento da comunicação visual foi muito abalado pelo encerramento das superfícies comerciais e que tem sido necessário adaptar-se às novas condições do mercado. Antecipa uma retoma lenta e espera que “os gráficos reaprendam a trabalhar e que saibam que não basta ter máquinas para produzir”.
Miguel Pina, do grupo Big Up, diz que as artes gráficas continuam a ser uma “arte, mas com um processo muito mais industrial e modernizado”. Para o jovem empresário, o segredo está na transmissão da confiança para o cliente e no estabelecimento de redes de cooperação entre as empresas. As perspetivas devem ser animadoras, refere, pois não conhece outro negócio “com tanta capacidade de reinvenção e adaptação à diversidade”.
Impressão digital
Julião Flaves Gaúna, da Pontual, diz que “o mercado se vai reerguer de forma diferente” e que terão de se adaptar.
Pedro Santos, em representação da Ocyan, diz que a impressão digital é a resposta às duas grandes tendências ainda mais evidentes com a pandemia: as curtas tiragens e a personalização. O grupo português sofreu uma quebra de faturação na ordem dos 50 a 60% com o “travão a fundo na economia”, que parou as grandes áreas para as quais trabalhavam, como a realização de eventos corporativos e musicais. Apesar de notar uma modesta retoma, Pedro não tem dúvida de que será um processo lento que deve ser enfrentado com otimismo pois, “enquanto as pessoas não mostrarem confiança, as marcas vão retrair-se”.